Fuga. Certos lugares são exatamente isso, um escape da realidade que pesa, independente do motive. Uma sutil catarse, na qual você sente os problemas da vida se esvaindo aos poucos, por mais clichê que isso seja. E fugir do agito de Punta para este recanto na parte rural de La Barra é uma fuga de cinema.Desde o estacionamento, que confunde os sentidos com as bicicletas enferrujadas que ali sossegam.
A fachada da casa que sustenta o restaurante Lo de Miguel deixa claro que aqui se cultivam uvas nas suas mais adoradas variações.
Antes mesmo do cardápio, a horta já antecipa o frescor dos ingredientes utilizados nos pratos aqui servidos.
E não poderia deixar de imaginar uma sobremesa com frutas vermelhas, sejam elas framboesas, sejam elas amoras.
A beleza do lugar me impediu de imediatamente sentar à mesa com os amigos, pois cada cantinho da construção reservava um charme especial.
Os vasos e cachepôs que resguardam os temperos levam um ar divertido com os triciclos antigos abandonados no lugar. Dá pra imaginar as crianças que em 1923 brincando até a mãe chamar para o almoço, e os brinquedos ficam ali mesmo.
A casa é construída no formato de um C, com uma fonte bem no meio.
E algumas mesas deliciosamente tortas junto ao pátio.
Ao fundo, a paisagem chega a ser uma covardia. O Narbona é, também, uma pequena vinícola, e a vontade de sentar sob o sol e ficar quieto...
E seguem os cantinhos com seus detalhes únicos. O que falar da garagem da casa?
Do tom de rosa das flores do jardim?
Os gostosos sofás, branquinhos, convidando ao ócio.
E, por que não, até uma parrilla.
Das várias opções para almoçar, a beleza e o frescor do dia jogaram a favor das mesas da rua com seus imensos sofás. Mas ainda precisava conhecer outros cantos do Narbona.
Quem quiser participar de alguma degustação promovida pela casa, o espaço adornado com garrafas de vinho ao redor da imensa lareira é o lugar ideal.
Ou se a idéia for curtir uma noite mais descontraída, o charmoso bar, que até um piano ao vivo recebe em certas noites.
Como se já não tivéssemos opções pra tudo que é lado, o Narbona ainda tem uma lojinha com produtos feitos na própria casa. Queijos, manteiga, azeites, chás, biscoitos amanteigados, vinhos...
... louças de chá e outros adornos delicados, para as meninas miarem de vontade de comprar.
Mas chega de caminhar, porque a idéia, afinal, era comer e beber bem. E a capa de cada cardápio já antecipava a sensação que teríamos, seja relacionando os prazeres do amor à boa mesa...
... seja de um puro e simples imperativismo.
De praxe, uma cestinha de pães frescos para comer com manteiga e azeite, salgando um pouco o paladar.
Um copo de água porque, afinal, não podemos esquecer deste que é o coadjuvante mais protagonista de qualquer boa mesa.
Tivemos o tempo e o prazer de aproveitar algumas lâminas extremamente finas de presunto cru, que estavam fantásticas.
E anéis de lula empanados, casando perfeitamente com aquelas gotas de limão que você está imaginando.
O frescor da tarde e a diversidade dos pratos pedidos convergiram para um vinho rosé: um Malbec da Finca La Linda.
Eu amo esse momento.
O lindo tom rubi era apenas um detalhe desse delicioso vinho.
Que merecia um repouso refrescante a altura de seus sabores.
Ao final, a mesa se dividiu em dois pratos: um suculento filé mignon com cogumelos.
E um peixe branco preparado na manteiga negra com alcaparras e queijo Roquefort. Sublime! Os legumes grelhados estavam igualmente deliciosos.
Post longo demais? É inevitável. Um lugar desses parece uma bolha. Você entra e deixa todas as preocupações da vida tão longe, mas tão longe, que a sensação é de que vivemos um breve sonho. O único problema? É que a realidade volta, brutal, ao pagar a conta de UY$1300 (R$110), chacoalhar a preguiça do corpo e, aos poucos, voltar aos ruídos que nos esperavam após um longo caminho.
Narbona Lo de Miguel
Camino Viejo a San Carlos, 4 km depois do posto Ancap da Barra
Viñas del Este (058 42) 77 22 45
Punta del Este – Uruguay
Bom para: teu último dia de vida
Ruim para: quem acha que Punta é ver e ser visto
Vento: por que é tão bom?
Narbona. Punta. Céu.
Cosmo Bar | hotel e bar heterofriendly
Heterofriendly. Não consegui conter a surpresa ao cair no site do hotel boutique Axel e me deparar com o conceito heterofriendly. Ao mesmo tempo pensei: po, é óbvio! Nada mais natural que um lugar homossexual também se dispa destes preconceitos. E foi só por essa, somada a algumas indicações, que resolvi conhecer o bar, também heterofriendly, do lounge deste hotel de San Telmo: o Cosmo.
Tudo bem, confesso que fiz questão de ir hetero-acompanhado, só pra, né, enfim, deixar claro. Se eu não sou tão cool assim como acho que sou, não importa. Importa é que o hotel é gay sim, mas total amigável para o hetero aqui. Logo ao passar o lounge, é descer as escadas cercadas por um espelhos d’água, pinturas lúdicas e outros detalhes bacanas.
Chama a atenção que o bar é virado para a piscina do hotel, que estava bem tranqüila neste dia. Aconchegante o espaço, e não fiquei pensando muito se as duchas eram familiares ou estava mais para o lado “dançando em uma jaula na Indonésia”. Enfim.
O salão em si é bonitão, bem iluminado, e imagino que fica melhor ainda pela noite. Algumas mesas baixas com confortáveis poltronas, mais alguns quadros aqui e ali, e as interessantes luminárias em formato de chama. Bom, parecem chamas na minha visão pelo menos.
O bar é apenas correto: garrafas selecionadas, alinhadinhas, e uma mescla de atendimento de balcão com o pessoal de room service transmitindo alguns pedidos.
Sentei, pedi uma bebida, e logo vem na mesa alguns amendoins salgados. Porque você sabe né, amendoim diz que ajuda na verticalidade máxima...
O pedido? Esqueci, mas me achei meio gay pedindo isso. Mas enfim, me sinto gay pedindo outros drinks também, e isso não impede de gostar desse drink, que era um frozen de alguma coisa com laranja, Cointreau e... dunno.
Ah, cadê o drink da minha companheira, você pode perguntar. Bom, eu juro que ela estava lá, mas não quis beber nada. Logo, foi pagar os $25 (R$13), e voltar pra casa para relatar minha experiência heterofriendly que, brincadeiras a parte, é apenas mais um bar bacana para conhecer. Ao menos para mim J
Cosmo Bar – Axel Hotels
Venezuela 649 (esq. Chacabuco) – San Telmo
Cap. Federal – Buenos Aires
(11) 4136 9393
www.axelhotels.com/buenosaires
Mapa
Bom para: friendlies
Ruim para: quem tem medo de homossexual saindo da piscina de roupão
Heterofriendly: duvido alguém criar um conceito melhor que esse
Il Ballo del Matone | italiano com arte
Um clássico de Buenos Aires. É só falar essa frase e o povo já imagina um bodegón com azulejos na parede, garçom de gravata borboleta servindo umas empanadas e um puchero – veja bem, eu disse puchero -, uma cidra caseira e, por que não, um bandoneón chorando um tango de Gardel. Esquece isso. Esse clássico aqui, Il Ballo del Matone, é a tratoria com mais personalidade que você vai ver por ai.
Esclarecendo: estamos no original, o primeiro de cinco – veja bem, eu disse cinco – restaurantes Il Ballo em Palermo Hollywood. Pra que cinco? Porque o dono é foda, simples assim. Adrián Francolini, a figuraça por trás do empreendimento, ícone da campanha “para todos” da etiqueta Bolivia, tem programa de rádio, web tv... Meio que rock star das tratorias.
O restaura é totalmente de acordo com o dono: uma mescla da paixão pela cozinha tradicional italiana com a inquietude enérgica da imaginativa mente do cara. Ou seja, por um lado as mesas com motivos florais e alhos pendurados...
... e por outro uma permanente exposição de arte, sejam nos quadros que compõe a galeria do restaurante ou nos inúmeros eventos que acontecem por lá.
Eu, no meu mais profundo conhecimento crítico no que tange pinturas, olhei pra cima e pensei: do caralho! Mas além disso não pude elaborar.
Se a overdose cultural do lugar não é bem a sua praia, então vá embora. Não, calma ai, não é para tanto. A área externa é tranqüila, a cerca viva deixa tudo bucólico e os guarda sóis impedem que o calor massacre nossas pobres cabeças.
Pois bem, queria tomar só um cálice de vinho, algo mais comedido. Pedi a carta de vinhos. Não veio. A menina me apontou para um quadro nas costas dela. Eu ri.
Como a essas alturas da maratona diária de álcool ou meu fígado já havia desistido de gostar de mim, a pedida foi um Pinotzinho bem manso e suave, da Alma Mora lá de San Juan.
Como o quadro estático com as opções de vinho tava rústico demais, era óbvio que o seria algo mais tradicional, e seria entregue em mãos, à mesa. Jura! Outro quadro, mas dessa vez ele cardápioveio até nós, carregado por essa figura que não podia estar se sentindo mais a vontade. Como em casa, literalmente. Eu ri. E, óbvio, me senti em casa.
Anota ai o Caramelle & Burrata. Uma massa phyllo em formato de bala recheada com mussarela, molho de tomate, temperinhos e mais outras coisas que não lembro. Sugestão do nosso amigo ali de regata, boa demais.
Meu prato foi um penne com cogumelos. Acho que a foto fala por si, não é?
Quem compartilhava a mesa comigo era ninguém menos que Josh Goldfein, criador do fantástico Guia Epicureo, e de extremo bom gosto: Grigliate Abadejo, um peixe macio, crocante e saboroso. Mandou bem.
Fechamos a conta em $75 (R$35) por pessoa. E, ao sair, uma sensação estranha. Ao invés de saciar o momento devido com essa experiência, fiquei é ainda mais curioso em conhecer os outros restaurantes do cara, ou de repetir a mesa em outro momento, com algum artista bizarro inventando algo na hora, tanto faz. O que é certo é o seguinte: uma vez só? Não dá.
Il Ballo del Matone
Gorriti 5737 (esq. Bonpland) – Palermo Hollywood
Cap. Federal – Buenos Aires
(11) 4776 4247
www.ilballo.tv
Mapa
Bom para: parar de pensar em Nono quando falar em tratoria
Ruim para: você, mente fechada, que nem devia estar lendo isso
Adrián: se eu te visse na rua, gostaria de apertar tua mão